Artigo | Mercado de carbono: a regulação de um mecanismo de concretização do desenvolvimento sustentável

Recentemente foi sancionada e publicada a Lei nº 15.042, de 11 de dezembro de 2024, que institui o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE) e regula o mercado de carbono, tendo por finalidade dar cumprimento à Política Nacional sobre Mudanças do Clima (PNMC) e aos compromissos assumidos pelo Brasil na Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC)[i].

A PNMC foi criada em 2009, visando a redução de emissões antropogênicas de gases de efeito estufa (GEE), a compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a proteção do sistema climático, bem como o estímulo ao desenvolvimento do SBCE, dentre outros[ii].

A UNFCCC, por sua vez, é mais antiga, promulgada em 1998, reconhece que as ações humanas contribuem substancialmente para as concentrações atmosférica de GEE, o que implica um aquecimento adicional na superfície e atmosfera da Terra, com efeitos negativos para o ecossistema e a humanidade.

Assim, a Convenção tem por objetivo a “estabilização das concentrações de gases de efeito estufa na atmosfera num nível que impeça uma interferência antrópica perigosa no sistema climático”[iii]. Para manter sob exame a sua implementação, a UNFCCC estabeleceu as conferências das partes (COP)[iv].

A propósito, na última COP, que ocorreu em novembro de 2024, o Brasil apresentou sua nova meta climática, a Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC)[v]. A NDC consiste em um esforço nacional para alcançar as metas do Acordo de Paris, ou seja, de limitar o aumento da temperatura a 1,5 ºC acima dos níveis pré-industriais, com medidas de mitigação a serem implementadas nacionalmente, de modo a reduzir as emissões de GEE[vi].

Além de apresentar o compromisso de reduzir as emissões líquidas de GEE no país de 59% a 67%, até 2035, em relação aos níveis de 2005, no documento da NDC, o Brasil traça diretrizes para transformação do modelo de desenvolvimento do país, o que abarca diversos setores da economia. Assim, apresenta “a visão de um país para 2035 que reconhece a crise climática, assume a urgência da construção de resiliência e desenha um roteiro para um futuro de baixo carbono para sua sociedade, sua economia e seus ecossistemas”[vii]. O SBCE é citado como um dos mecanismos do Plano de Transformação Ecológica, visando a implementação do Plano Clima.

Portanto, pode-se considerar que o SBCE figura como um dos mecanismos para uma virada sustentável e concretização de compromissos internacionais assumidos pelo Brasil visando a proteção do sistema climático e do meio ambiente, que é finalmente instituído após anos de tramitação do Projeto de Lei no Congresso Nacional.

O SBCE consiste em um “ambiente regulado submetido ao regime de limitação das emissões de GEE e de comercialização de ativos representativos de emissão, redução de emissão ou remoção de GEE no País”. Portanto, é o espaço no qual serão comercializadas as cotas brasileiras de emissões (CBE) e os certificado de redução ou remoção verificada de emissões (CRVEs)[viii].

A CBE é o ativo representativo do direito de emissão de 1 tCO2e (uma tonelada de dióxido de carbono equivalente), enquanto o CRVE é o ativo representativo da efetiva redução de emissões ou remoção de GEE de 1 tCO2e (uma tonelada de dióxido de carbono equivalente) [ix].

A emissão consiste na liberação de GEE por ações humanas, dentro de uma determinada área por um determinado período. Por outro lado, a remoção é a retirada de GEE da atmosfera, o que pode ocorrer mediante recuperação de vegetação nativa, reflorestamento, incremento de estoques de carbono, dentre outras atividades. Já a redução significa a diminuição da quantidade de GEE lançados na atmosfera por determinada atividade durante um determinado período, tendo por base um nível de referência, o que pode ocorrer de diversas maneiras, mediante intervenções direcionadas para tanto, como preservação florestal, eficiência energética e energias renováveis[x].

Para o reconhecimento no âmbito do SBCE, os ativos acima mencionados, CBE e CRVE, deverão ser inscritos no Registro Central do SBCE. O Registro Central do SBCE será criado, mantido e gerido pelo órgão gestor do SBCE[xi].

O Registro Central do SBCE irá receber e consolidar as informações acerca das emissões e remoções de GEE, contabilizando as transações – concessão, aquisição, detenção, transferência e cancelamento – relativas aos ativos do SBCE, além de fazer o rastreamento das transações[xii].

Os créditos de carbono são ativos que representativos de retenção, redução de emissões ou remoção de 1 tCO2e (uma tonelada de dióxido de carbono equivalente), obtido a partir de projetos ou programas de retenção, redução ou remoção de GEE, realizados por entidade pública ou privada, que utilizam critérios externos ao SBCE[xiii].

É possível que esses créditos de carbono sejam considerados ativos integrante do SBCE, sendo necessário sua inscrição no Registro Central do SBCE, que tenham origem a partir de metodologias credenciadas pelo órgão gestor do SCBE, bem como que sejam mensurados e relatados pelos responsáveis pelo projeto e verificado por autoridade independente, conforme metologia credenciada pelo SBCE[xiv].

Os ativos do SBCE e os créditos de carbono poderão ser negociados no mercado financeiro. Nesse caso, serão considerados caso como valores mobiliários e se sujeitarão à regulamentação da Comissão de Valores Mobiliários[xv].

De todo modo, o SBCE ainda precisará ser implementado, o que será realizado em cinco fases. A primeira fase será de edição da regulamentação da lei, em um período de 12 meses. A segunda e terceira fases serão para operalização dos instrumentos para relato de emissões pelos operadores e sua sujeição ao dever de submissão de plano de monitoramento de apresentação de relato de emissões e remoções de GEE. Assim, na quarta fase vigerá o primeiro Plano Nacional de Alocação, no qual serão distribuídos de forma não onerosa os CBEs e implementado o mercado de ativos. Na última fase, o mercado estará implementado plenamente, após a vigência do primeiro Plano Nacional de Alocação[xvi].

O Plano Nacional de Alocação estabelecerá o limite máximo de emissões para cada período de compromisso, assim como a quantidade de CBEs para cada operador e suas formas de alocação, além do percentual máximo que será admitido na conciliação periódica das obrigações. A conciliação periódica das obrigações diz respeito à verificação do cumprimento dos compromissos ambientais definidos por operador, mediante a titularidade dos ativos integrantes do SBCE em quantidade igual às emissões líquidas incorridas[xvii].

Esse plano será feito para períodos de compromissos, no qual deverão ser cumpridas metas de redução de emissões de GEE definidas de acordo com o teto máximo de emissões. A sua aprovação ficará a cargo do Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima (CIM), mas será elaborado e submetido pelo órgão gestor, que deverá implementá-lo[xviii].

O SBCE sujeita à sua regulação os operadores, pessoas físicas ou jurídicas, que tenham instalação ou fonte associada a alguma atividade emissora de GEE que emita mais de 10.000 tCO2e (dez mil toneladas de dióxido de carbono equivalente) por ano, sendo que aquelas que emitem mais de 25.000 tCO2e (vinte e cinco mil toneladas de dióxido de carbono equivalente) por ano terão de apresentar relato de conciliação periódica de obrigações, ou seja, do cumprimento dos compromissos ambientais definidos por operador no Plano Nacional de Alocação[xix].

Portanto, a Lei nº 15.042, de 11 de dezembro de 2024 institui o SCBE, propiciando um ambiente no qual serão comercializados ativos para buscar uma diminuição das emissões de GEE, com a definição de compromissos ambientais e disciplina financeira de negociação desses ativos, cumprindo com compromissos internacionais há muito firmados e indo ao encontro da visão de um país apresentada nas NDC da COP 29.

Ana Carolina Coelho Santosgraduada em Direito pelo CEUB. Pós-graduada em Direitos Sociais, Ambientais e do Consumidor pelo CEUB/ICPD e em Nova Tendências do Direito Pública pelo CEUB/ICPD. Pós-graduanda em Segurança Digital, Governança e Gestão de Dados pela PUC/RS. Aluna especial do mestrado em Direito no CEUB/ICPD. 


[i]  https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2024/lei/L15042.htm

[ii] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l12187.htm

[iii] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d2652.htm

[iv] https://www12.senado.leg.br/noticias/entenda-o-assunto/cop

[v] https://www12.senado.leg.br/noticias/entenda-o-assunto/cop

[vi] https://brasil.un.org/pt-br/88191-acordo-de-paris-sobre-o-clima

[vii] https://www.gov.br/mma/pt-br/assuntos/noticias/brasil-entrega-a-onu-nova-ndc-alinhada-ao-acordo-de-paris/ndc-versao-em-portugues.pdf/

[viii] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2024/lei/L15042.htm

[ix] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2024/lei/L15042.htm

[x] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2024/lei/L15042.htm

[xi] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2024/lei/L15042.htm

[xii] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2024/lei/L15042.htm

[xiii] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2024/lei/L15042.htm

[xiv] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2024/lei/L15042.htm

[xv] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2024/lei/L15042.htm

[xvi] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2024/lei/L15042.htm

[xvii] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2024/lei/L15042.htm

[xviii] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2024/lei/L15042.htm

[xix] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2024/lei/L15042.htm

 

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