O Princípio do Desenvolvimento Sustentável é norteador dentro da seara ambiental. O Relatório Brundtland o conceituou como sendo aquele que “atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem a suas próprias necessidades”[i].
Essa ideia de satisfação das necessidades da geração atual respeitando as necessidades das gerações futuras vige no ordenamento pátrio e foi incluído na Carta Constitucional, no art. 225, que prevê o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, vinculando-o à sadia qualidade de vida, impondo a sua defesa para toda a coletividade, assim como ao Poder Público, de modo a defendê-lo e preservá-lo para as futuras gerações[ii].
A proteção do meio ambiente na Constituição Federal, ainda aparece como princípio geral da atividade econômica, previsto no art. 170[iii], o que deixa cristalina a intenção do constituinte de conciliar a preservação ambiental com as práticas da atividade econômica, que inclui o crescimento econômico.
De tal modo, verifica-se que o crescimento econômico deve estar em consonância com a manutenção de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, até mesmo porque o desenvolvimento econômico, assim como o tecnológico, só se faz possível diante da utilização e transformação de elementos que compõe o meio ambiente, o qual presta, por sua vez, serviços essenciais para a manutenção da vida, com qualidade[iv].
A necessidade de preservação ambiental, portanto, não se faz somente para que as condições de uma vida saudável sejam preservadas, o que já seria suficiente para justificá-lo, mas também para que o desenvolvimento seja possível, eis que a matéria prima necessária ao seu fomento, e para a expansão econômica, precisa estar disponível para utilização, a qual é disponibilizada pelo meio ambiente[v].
De toda sorte, a busca por meios eficientes para se alcançar o desenvolvimento sustentável, visando a manutenção de uma vida de qualidade e o desenvolvimento econômico e social, é imperativa e tem ganhado cada vez mais notoriedade.
Nesse sentido, no mês passado, fevereiro de 2024, o Governo Federal, ao realizar reunião preparatória da Iniciativa de Bioeconomia do G20, afirmou a necessidade de buscar instrumentos concretos de desenvolvimento sustentável, pontuando, ainda, que a bioeconomia é um tema estratégico para o desenvolvimento de toda atividade de indústria e economia do país, além da promoção do desenvolvimento social e preservação ambiental[vi].
Dentro das ferramentas de bioeconomia, em 2021, mediante a Lei 14.119/2021, foi instituído o Pagamento por Serviços Ambientais, que consiste na transferência de recursos financeiros ou outra forma de remuneração para um provedor dos serviços ambientais, ou seja, para aquele que recupera ou melhora as condições ambientais dos ecossistemas[vii].
Nesse passo, criou-se uma ferramenta de bioeconomia que possibilita que atividades, sejam individuais ou coletivas, que favoreçam a manutenção e a recuperação, bem como a melhoria dos serviços ecossistêmicos, sejam remuneradas[viii].
De certo modo, percebe-se um incentivo à preservação ambiental, haja vista que as atividades que visam a manutenção do meio ambiente ecologicamente equilibrado poderão ser remuneradas, por fomentarem os serviços ecossistêmicos, que se consubstanciam como “benefícios relevantes para a sociedade gerados pelos ecossistemas, em termos de manutenção, recuperação ou melhoria das condições ambientais”[ix].
A Lei 14.119/2021 instituiu, ainda, a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais que tem, dentre seus objetivos, incentivar a criação de um mercado de serviços ambientais, ou seja, um mercado para remunerar aquele que preserva o meio ambiente[x].
Conforme disposto na lei, o pagamento poderá ser monetário, por títulos verdes, por compensação vinculada à certificado de redução de emissões por desmatamento e degradação, dentre outras, existindo previsão de ampliação das modalidades de pagamento por atos normativos do órgão gestor da a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais[xi].
Um Programa Federal de Pagamento por Serviços Ambientais, para efetivar a Política Nacional relativamente ao pagamento desses serviços pela União, também foi criado. Para participar desse programa é necessário, além do cumprimento de outros requisitos, estar enquadrado em uma das ações que por ele serão promovidas, por exemplo, a conservação e a recuperação de vegetação nativa, a manutenção de áreas cobertas por vegetação nativa que seriam passíveis de autorização para supressão, ou, ainda, o manejo sustentável de sistemas agrossilvopastoris que contribuam para a captura e retenção de carbono[xii].
Dentre os imóveis privados, aqueles situados em zona rural inscritos no CAR, as Reservas Particulares do Patrimônio Natural e zonas de amortecimento são elegíveis para provimento dos serviços ambientais, bem como as áreas de preservação permanente, reserva legal, conforme regulamento[xiii].
O regulamento, entretanto, ainda não foi editado, mas o governo já demonstrou interesse na referida regulamentação, conforme noticiado pela secretária nacional de Bioeconomia do Ministério do Meio Ambiente, na Câmara dos Deputados, em meados do ano passado[xiv].
Ainda no ano passado, em outubro, foi instituído Grupo de Trabalho, mediante a Portaria GM/MMA nº 7778, de 5 de outubro de 2023, para elaborar proposta de Decreto para a regulamentação da lei, coordenado pela Secretaria Nacional de Bioeconomia, com representante de diversas secretarias vinculadas ao Ministério do Meio Ambiente, além de representante do IBAMA e do ICMBio[xv].
No momento do encerramento dos trabalhos do Grupo de Trabalho, cujo prazo inicial de duração foi previsto como sendo de 90 dias, prorrogável por igual período, será entregue relatório final, contendo minuta de Decreto para regulamentação da Lei 14.119/2021, à Ministra de Estado do Meio Ambiente e Mudança do Clima.
O regulamento, conforme previsto em lei, deverá definir cláusulas essenciais para cada tipo de contrato de pagamento por serviços ambientais, ainda, direitos e obrigações do provedor e pagador, condições de acesso pelo poder público à área objeto do contrato, bem como outras questões[xvi].
Nesse contexto, o Governo Federal demonstra a intenção de viabilizar que esse instrumento de bioeconomia, o Pagamento por Prestação de Serviços Ambientais, venha a ser plenamente aplicável em âmbito federal, efetivando o Programa Federal de Pagamento por Serviços Ambientais, possibilitando a remuneração pela preservação ambiental.
Ana Carolina Coelho Santos, graduada em Direito pelo CEUB. Pós-graduada em Direitos Sociais, Ambientais e do Consumidor pelo CEUB/ICPD e em Nova Tendências do Direito Pública pelo CEUB/ICPD. Pós-graduanda em Segurança Digital, Governança e Gestão de Dados pela PUC/RS. Aluna especial do mestrado em Direito no CEUB/ICPD.
[i] COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. Nosso Futuro Comum. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1991. p. 46.
[ii]BRASIL. Constituição da República Federativa do brasil de 1988. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 21 mar. 2024.
[iii] BRASIL. Constituição da República Federativa do brasil de 1988. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 21 mar. 2024.
[iv] RODRIGUES, Marcelo A. Direito ambiental. São Paulo: Editora Saraiva, 2024.
[v] RODRIGUES, Marcelo A. Direito ambiental. São Paulo: Editora Saraiva, 2024.
[vi] BRASIL. Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima. Governo federal realiza reunião preparatória da Iniciativa de Bioeconomia do G20, 2024. Disponível em: <https://www.gov.br/mma/pt-br/governo-federal-realiza-reuniao-preparatoria-da-iniciativa-de-bioeconomia-do-g20#:~:text=A%20bioeconomia%20promover%C3%A1%20o%20desenvolvimento,instrumentos%20concretos%20de%20desenvolvimento%20sustent%C3%A1vel. Acesso em: 21 mar. 2024.
[vii] BRASIL. Lei 14.119/2021. Institui a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais; e altera as Leis n os 8.212, de 24 de julho de 1991, 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, e 6.015, de 31 de dezembro de 1973, para adequá-las à nova política. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/l14119.htm>. Acesso em: 21 mar. 2024.
[viii] BRASIL. Lei 14.119/2021. Institui a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais; e altera as Leis n os 8.212, de 24 de julho de 1991, 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, e 6.015, de 31 de dezembro de 1973, para adequá-las à nova política. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/l14119.htm>. Acesso em: 21 mar. 2024.
[ix] BRASIL. Lei 14.119/2021. Institui a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais; e altera as Leis n os 8.212, de 24 de julho de 1991, 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, e 6.015, de 31 de dezembro de 1973, para adequá-las à nova política. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/l14119.htm>. Acesso em: 21 mar. 2024.
[x] BRASIL. Lei 14.119/2021. Institui a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais; e altera as Leis n os 8.212, de 24 de julho de 1991, 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, e 6.015, de 31 de dezembro de 1973, para adequá-las à nova política. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/l14119.htm>. Acesso em: 21 mar. 2024.
[xi] BRASIL. Lei 14.119/2021. Institui a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais; e altera as Leis n os 8.212, de 24 de julho de 1991, 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, e 6.015, de 31 de dezembro de 1973, para adequá-las à nova política. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/l14119.htm>. Acesso em: 21 mar. 2024.
[xii] BRASIL. Lei 14.119/2021. Institui a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais; e altera as Leis n os 8.212, de 24 de julho de 1991, 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, e 6.015, de 31 de dezembro de 1973, para adequá-las à nova política. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/l14119.htm>. Acesso em: 21 mar. 2024.
[xiii] BRASIL. Lei 14.119/2021. Institui a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais; e altera as Leis n os 8.212, de 24 de julho de 1991, 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, e 6.015, de 31 de dezembro de 1973, para adequá-las à nova política. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/l14119.htm>. Acesso em: 21 mar. 2024.
[xiv] BRASIL. Câmara dos Deputados. Governo deve regulamentar em breve pagamento por serviços ambientais. 2023. Disponível em: <https://www.camara.leg.br/noticias/968283-governo-deve-regulamentar-em-breve-pagamento-por-servicos-ambientais/#:~:text=O%20Pagamento%20por%20Servi%C3%A7os%20Ambientais,um%20cadastro%20nacional%20destes%20benefici%C3%A1rios.> Acesso em: 21 mar. 2024.
[xv]BRASIL. Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima. Portaria GM/MMA nº 778, de 5 de outubro de 2023. Institui Grupo de Trabalho – GT PSA para elaborar proposta de Decreto para regulamentação da Lei 14.119, de 13 de janeiro de 2021. Disponível em: <https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-gm/mma-n-778-de-5-de-outubro-de-2023-515384533>. Acesso em: 21 mar. 2024.
[xvi] BRASIL. Lei 14.119/2021. Institui a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais; e altera as Leis n os 8.212, de 24 de julho de 1991, 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, e 6.015, de 31 de dezembro de 1973, para adequá-las à nova política. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/l14119.htm>. Acesso em: 21 mar. 2024.