No dia 7 de abril de 2024, o Superior Tribunal de Justiça completou 35 (trinta e cinco) anos de existência. Criado pela Constituição Federal de 1988, é a corte responsável pela uniformização da interpretação da lei federal, que não envolva matéria constitucional (de competência do STF) ou justiça especializada (direito do trabalho, eleitoral e militar). Em homenagem a seu aniversário, repassaremos brevemente pontos de interesse e relevância de sua trajetória e funcionamento.
Origem
Sua origem está interligada com o Tribunal Federal de Recursos (TFR), criado em 1946 e extinto em 1988. Era a instância revisional das sentenças prolatadas pelos juízes federais, composta inicialmente por nove ministros, chegando a vinte e sete pela Emenda Constitucional nº 7 de 1977.
Um dos seus objetivos era reduzir a sobrecarga do Supremo Tribunal Federal, na tentativa de superar a “crise do Supremo”, que se encontrava abarrotado de novos processos diariamente. O jurista Alfredo Buzaid conta que havia “o desequilíbrio entre o número de feitos protocolados e o de julgamentos por ele proferido. […] se acumulando os processos não julgados, resultando daí, o congestionamento”.
Com a Constituição de 1988, o TFR foi extinto, sendo criado em seu lugar os cinco Tribunais Regionais Federais (TRF), ocorrendo sua descentralização. Seus ministros foram realocados no recém-criado STJ. A Carta Magna determinou em seu texto, a independência do Tribunal, dando autonomia administrativa, financeira e funcional.
Em todos esses anos, o STJ julgou aproximadamente sete milhões de processos, orientando com suas decisões, os tribunais estaduais e federais em casos semelhantes. Entre os temas relevantes, cita-se o Tema 1.082, onde se decidiu que a operadora deve custear tratamento de paciente grave mesmo após rescisão do plano coletivo, e tema 1.016, onde a segunda seção reconheceu a validade do reajuste por faixa etária em planos de saúde coletivo.
o STJ também é reconhecido por sua inovação, sendo o primeiro tribunal a se tornar totalmente digital. Inicializou em 2009 a digitalização de seu acervo, finalizando em 2017, extinguindo em definitivo processos em papel e retornando os volumes dos autos aos tribunais de origem.
Entre os destaques de seu avanço tecnológico, cita-se as transmissões de julgamento pelo youtube, permitindo o acompanhamento das sessões por qualquer interessado com acesso à internet e a realização de sustentação oral pelos advogados de modo online, sem que haja a necessidade de deslocamento a Brasília.
Organização Interna
O Superior Tribunal de Justiça é composto por trinta e três ministros, divididos em diferentes órgãos internamente.
A Corte Especial é composta pelos quinze ministros mais antigos, representa o órgão máximo do tribunal, incumbido de decidir sobre a interpretação em casos de entendimentos divergentes entre os órgãos especializados, além de determinar a aplicação da legislação federal.
Por sua vez, o plenário, sob liderança da presidência do STJ, reúne todos os trinta e três ministros. Julgam questões administrativas relacionadas à responsabilidade dos magistrados, alterações no regimento interno e eleições para os cargos de presidente e vice-presidente do tribunal.
O STJ é dividido em três seções especializadas, cada uma com dez ministros, dedicadas a uniformizar a jurisprudência interna do tribunal. A 1ª seção, voltada para o direito público, trata de temas como previdência, licitações e contratos administrativos, responsabilidade estatal e tributação.
A 2ª seção, por sua vez, aborda questões de direito privado, incluindo obrigações contratuais, direito de família e sucessões, propriedade e comércio em geral. Por último, a 3ª seção é responsável por questões relacionadas ao direito penal, englobando crimes em geral, análise de redução de penas e habeas corpus.
Além dos órgãos mencionados, o STJ é constituído por seis turmas, cada uma composta por cinco ministros, encarregadas do julgamento de recursos especiais e agravos em recurso especial. As turmas são divididas da seguinte maneira: 1ª e 2ª turma tratam de direito público; 3ª e 4ª turma abordam questões de direito privado; a 5ª e 6ª turma concentram-se no direto penal.
A Presidência do STJ é ocupada por um ministro eleito pelo plenário do tribunal para um mandato de dois anos, podendo ser reconduzido por mais dois anos. Ele representa o tribunal, dirige os trabalhos administrativos e preside as sessões do plenário. Por fim, a Corregedoria-Geral de Justiça fiscaliza e orienta a atuação dos magistrados de primeiro e segundo graus de jurisdição.
Para se tornar um ministro, é necessário atender determinados requisitos, incluindo ser brasileiro, possuir mais de trinta e cinco e menos de setenta anos de idade, demonstrar notável saber jurídico, reputação ilibada e acumular mais de dez anos de efetiva atividade profissional.
A origem dos membros do STJ é diversificada, sendo um terço é selecionado entre os desembargadores federais, outro terço entre os desembargadores de justiça e o restante entre advogados e membros do Ministério Público. Atualmente duas vagas estão em aberto decorrentes da aposentadoria das ministras Laurita Vaz e Assussete Magalhães.
Em março o STJ recebeu as listas com os nomes dos candidatos, totalizando quarenta e um nomes indicados pelo Ministério Público e dezessete nomes pelos TRFs. Contudo, ainda não foi agendada uma data para a sessão do plenário que formará as duas listas tríplices. Posteriormente, essas listas serão encaminhadas para a escolha do Presidente da República, cujas nomeações necessitarão da aprovação por maioria absoluta do Senado Federal.
PEC da Relevância
A descentralização dos tribunais teve como principal objetivo a diminuição de demanda processual. Entretanto, mesmo após a instalação do STJ, está entre seus principais desafios o volume de processos, que cresce de modo desenfreado a cada ano. De acordo com a Ministra Presidente Maria Thereza, em 2023 o tribunal recebeu mais de 460 mil novos casos.
A vista disso, foi promulgada a Emenda Constitucional nº 125, que adiciona uma condição para a admissibilidade recursal: para o recurso especial ser admitido, o recorrente deverá demonstrar a relevância da questão jurídica federal discutida no caso. Assim, o STJ poderá recusar o julgamento de recursos cujo tema não tenha relevância capaz de justificar o pronunciamento da instância superior (art. 105, §2º, CF).
Para maior segurança, a emenda determina relevância presumida (ou seja, considerada “automaticamente relevante”) os seguintes casos previstos no art. 105, §3º, da Constituição Federal:
I – ações penais;
II – ações de improbidade administrativa;
III – ações cujo valor da causa ultrapasse 500 (quinhentos) salários mínimos;
IV – ações que possam gerar inelegibilidade;
V – hipóteses em que o acórdão recorrido contrariar jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça;
VI – outras hipóteses previstas em lei.”(NR)
O critério de relevância do recurso especial somente será exigido após a vigência de uma futura lei reguladora, conforme o Enunciado administrativo nº 8, aprovado pelo Plenário do STJ. No final de 2022, o tribunal encaminhou uma sugestão de anteprojeto inspirado na regulamentação da repercussão geral existente no STF, ao presidente do Senado. A proposta está atualmente pendente de deliberação.
O STJ justificou sua proposta observando seu papel como corte de uniformização, dado que se encontrava limitado em sua capacidade de cumprir plenamente sua função devido ao incessante número de novos recursos diários que afetam os interesses entre as partes, sem ter repercussão na interpretação das leis federais. Com a regulação da Emenda Constitucional nº 125, espera-se restaurar a função da corte e possibilitar análise mais profunda dos casos, promovendo assim a uniformidade na interpretação do direito.
Conclusão
Ao completar 35 anos de existência, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) é peça fundamental do sistema judiciário brasileiro, desempenhando um papel necessário na uniformização da interpretação da lei federal. Desde sua origem, o tribunal tem evoluído para enfrentar os desafios do sistema judiciário, como a sobrecarga de processos e a necessidade de modernização.
No entanto, apesar dos avanços, o tribunal ainda enfrenta o crescente volume de processos. A recente Emenda Constitucional nº 125, que introduz o requisito da relevância para admissibilidade recursal, evidencia a busca por soluções para lidar com essa questão. Espera-se que com a implementação efetiva dessa emenda, a eficiência do STJ será garantida.
Assim, ao celebrar seus 35 anos, o Superior Tribunal de Justiça reafirma seu compromisso com a proteção dos direitos dos cidadãos, enquanto continua a adaptar-se às demandas e desafios do sistema judiciário brasileiro.
Necessário destacar também que o escritório Perman mantém um compromisso constante em acompanhar de perto as inovações e decisões dos tribunais superiores. Nossa equipe se mantém atualizada com as jurisprudências mais recentes, incorporando-as em nossa prática diária para garantir que nossos clientes se beneficiem das mais recentes tendências e análises jurídicas.
Jade Maria Ferrarini Ferreira, advogada, graduada pelo Instituto de Educação Superior de Brasília. Recebeu Láurea Acadêmica devido ao desempenho acadêmico excepcional. Possui experiência concentrada em Contencioso Cível e recursos para os Tribunais Superiores.
REFERÊNCIAS
i) Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 18 de abril de 2024.
ii) Tribunal Superior, regimento interno, Brasil. 2. Brasil. Superior Tribunal de Justiça (STJ), regimento. I. Brasil. Superior Tribunal de Justiça. Gabinete do Ministro-Diretor da Revista. II. Título.
iii) Superior Tribunal De Justiça. STJ. Ep. 1 – Constituição 35 Anos: a história da criação do STJ contada por ministros fundadores. Youtube, 10 de out. de 2023. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=2ySU40i88Sc. Acesso em: 16 de abril de 2024.
iv) Brasil. Superior Tribunal de Justiça. STJ história: criação, instalação e desenvolvimento do Superior Tribunal de Justiça. Superior Tribunal de Justiça, Secretaria de Documentação, Coordenadoria de Gestão Documental – Brasília – STJ, 2024. Disponível em: https://bdjur.stj.jus.br/jspui/handle/2011/185540. Acesso em 18 de abril de 2024.
v) Rocha de Assis Moura, Maria Thereza. Conquistas, desafios e esperanças nos 35 anos do STJ. Jota, 2024. Disponível em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/conquistas-desafios-e-esperancas-nos-35-anos-do-stj-07042024. Acesso em 18 de abril de 2024.
vi) Brasil. Emenda Constitucional nº 125, de 14 de julho de 2022. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc125.htm
vii) Brasil. Superior Tribunal de Justiça. Disponível em: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Inicio. Acesso em: 18 de abril de 2024.